Um litro de água ferve em cinco minutos. Serve o primeiro para pensar na vida e o meio seguinte para dela rir; os restantes passam-se fitando o tecto enquanto não ferve a água com que farei chá. De saqueta, porque não é mau, é fácil, não pode correr mal.
Sunday, November 29, 2009
Tuesday, November 24, 2009
Olvidei o arrogo a querer ser tua.
Na sua ausência, a ilusão
de te pertencer e contigo poder
gastar o tempo e ver o mar.
É metade da transição madrugada,
sinto a hora mais fria e desfaço-me
em ti. Mentes-me, mentes-te. Ninguém
nos diz que é errado correr as dunas;
cansaram-se... pois de novo escureces
e eu, cega, rasgo mais um livro e parto
à procura dessa casa em que vives -
- sempre a mesma, com ela - a errada.
(Repete.)
Tuesday, October 20, 2009
Nasceste no dia errado. Num dia de luto. Não devias ter aparecido, como se fosse a coisa mais natural deste mundo e do outro, de mãos nos bolsos e perguntas curiosas nos passos lentos e ombros despreocupados. Tenho, a contragosto, uma nova canção preferida. Desaparece-me da frente. Não me deixes fugir.
Saturday, October 17, 2009
Das Viagens Livres e Frequentes pelos Antípodas da Razão
Paper cranes, paper planes!, anuncia. Aquelas roupas velhas e coçadas contam histórias a cada olhar. Ficam-lhe bem, companheiras agradáveis das longas suiças e monóculo riscado. Deambula por entre os passageiros sem se fazer notar, feito extraordinário, ele, que apregoa todos os sonhos da miudagem. Desconheço a sua idade. Ouvi-o cantarolar, uma vez, baixinho, em Português. Nunca mais o vi.
Diz-me porque ardes / Fogo contínuo / os toros / pérfidos da discórdia / quando igualmente / guloso crepitas / a anarquia / da Regente a depôr.
Monday, October 12, 2009
Tuesday, September 29, 2009
Sunday, September 27, 2009
Sunday, August 30, 2009
Dear Lost,
Would it be too daring to call it an exercise of foretelling? It is no more real than it is a story, but has a great deal to do with how I foresee my own senescence.
Tuesday, August 25, 2009
“Bolas para esta geringonça!”, exclamou, irritado, o cirurgião velhote que me estava operando o sopro com que nascera. Segurava o meu coração nas mãos, mas era à máquina com foles estranhos que se dirigia. Familiarmente, como se não fosse a primeira vez que se resolvesse a guinchar a meio do procedimento, ameaçando o bom termo da operação.
Engolia ainda o doutor a saliva do impropério e já uma das enfermeiras se deslocara até à máquina insultada, o látex da luva fingindo conforto enquanto duas ou três palavras meigas a incitavam a funcionar. Levantei a cabeça, descrente e curiosa, e paguei ambas com um aperto desconfortável numa das aurículas. “Esteja quieta, menina, que o seu caso é sério.”
«Não faz sentido nenhum, ‘vó», interrompi, seguro do pouco que sabia do desenrolar de uma cirurgia. «Uma intervenção dessas precisa de anestesia, e a senhora não poderia levantar a cabeça.»Achei conveniente simular o ar céptico e condescendente com que meus pais recebiam minhas esfarrapadas desculpas de modo a faltar à escola. Quase correu bem. Tremeluziram as meninas dos olhos com humor à senhora sentada à minha frente, e rapidamente me admoestou. «O menino está interessado em ouvir o resto, creio?»
Queixei-me em surdina às luzes industriais afixadas no tecto de betão pintado. ‘A Geringonça não gosta de mim’. Desejei que sim, pois já me latejavam as frontes devido à falta de oxigénio. Alguém gritou que estava a ficar cianosada, e mais uma vez se contorceu a cara do doutor num esgar de concentração. Voltou a apertar meu coração em diferentes sítios, toques aqui e acolá, aproximou-o do ouvido e repetiu. Repetiu. Repetiu. Até que ecoou pela sala esterilizada um murmúrio de glóbulos apressados e plaquetas histéricas. Uma assistente de caracóis recolheu uma amostra que transportou com todo o cuidado até ao microscópio. “Então?”, quis saber o doutor, cuidando de monitorizar convenientemente os ventrículos, não fosse eu constipar-me e apanhar uma arritmia. O interno riu-se e desligou o aparelho. “É inocente.” Piscou-me o olho à socapa. “A miúda está a crescer.”
«Só isso?!», indignei-me, dividido entre a desilusão do desfecho e a hilaridade das imprecisões médicas. A tendência da minha avó para os dramatismos soft era deliciosa, raramente resistindo à introdução de frases comuns para terminar histórias rocambolescas. «Obviamente que não, pequeno cavaleiro. Tiveram de recolocar o coração e ajeitar as restantes miudezas, encontrar o xifóide e tapar bem com o esterno antes de me darem uns pontos feios de bradar aos céus.» Logo a ela, que bordava tão bem… «Que aconteceu à Geringonça, ‘vó?» «Reformou-se. Pouco depois, veio cá para casa. Queres conhecê-la?» Respondia sempre que sim, como se fosse a primeira vez que ouvia a história.
Continuo sem saber se ela não tinha, de facto, noção de não ser. Mas aquelas tardes passadas a ouvi-la contar aventuras inverosímeis e histórias adulteradas por uma memória traiçoeira, até que minha mãe viesse, zangada, chamar-me para jantar, valeram muito mais do que todos os compêndios decorados a caminho de me tornar médico em sua homenagem. Pediatra, porque aquela miúda-senhora-menina ficou sempre à espera de um dia fazer jus às palavras do interno e crescer.
Monday, August 24, 2009
Saturday, August 22, 2009
Thursday, July 09, 2009
Sunday, May 31, 2009
Das Viagens Livres e Frequentes pelos Antípodas da Razão
Decidiram alterar a rota, embora o destino permaneça o mesmo. Foge-nos agora quando lá iremos chegar. Verdade seja dita, antes também não sabíamos; mas esperávamos que fosse entretanto.
Dizem que o tempo amanhã levanta. Por mim, tudo bem. Há algo nestas trovoadas que não bate certo: algo entre o frio que até os ossos enregela e os parcos clarões desprovidos de ribombares. Não é só de mim: eles acham o mesmo, só que não se queixam. Preferem andar taciturnos. Como ela diz, eith. Manta pelos ombros e outro cigarro no convés talvez me ajudem a perceber. Oh, as trovoadas - eles ficam bem.
Monday, May 18, 2009
Movem-se lestas, imperiosas,
imponentes volumes de magnificência,
majestosas, marchando, marchando ao
rabujo ensonado da indústria e continuam
os pássaros a chinfrinar, um ponto ou
outro lumina nevoeiro fora,
esbateram-se seus cumes, vales, vão mais
distantes, clareia e se vão os celestes,
virão, estão as aves e o metal batido, elas
lestas, imperiosas, marchando,
imponentes, marchando, ominosas.
Monday, May 11, 2009
Friday, May 01, 2009
Thursday, April 30, 2009
Lost said...
"Only massive stars explode as they near the end of their lives."
Some other tiny things do so to keep living, though.
Tuesday, April 28, 2009
Queria ser um pouquinho surda do esquerdo,
Mas estou apenas cega de tanto ver;
Queria ter os vergões nos dedos de uma e dormentes os da outra,
Mas já nem sequer se lembram os braços de como se mover;
Queria tê-los aqui, inteiros e meus inteiramente,
Mas algures na caixa continuam a perecer;
Queria nunca ter desistido nem sucumbido ao medo,
Mas agora é tarde.
Thursday, April 23, 2009
Tuesday, April 21, 2009
Ergue-se rico e pachorrento no ciano claro da manhã, excepcionalmente sólido e redondo. Custa a crer em tão grande distância. Apetece estender a mão e colher a suculência acabada de madurar. Até os farrapos insípidos de um céu demasiado agitado se rendem ao seu magnetismo, aberrações laranjas, rosas e violetas esvoaçando na frescura de mais um dia. Que pede um casaco ligeiro enquanto arrefece o café preto que vou bebericando. Sabe bem estar na varanda. Mesmo depois de acordar estremunhada pela claridade e a vontade imediata ter sido mandá-lo às malvas. Para o bem e para o mal, um quarto virado a Este por estas latitudes significa madrugar.
Wednesday, April 08, 2009
Não devemos nada às pessoas que nos amam ou marcam, disseste.
Mas quero dever-te. Porque embora tendo um rosto não te conheci ainda substância, e se estendo a mão tu não chegas. Porque me frustram esses lábios e boca que a outras pertencem e nunca invadi, e posso apenas sonhar tocar-te e reclamar em mim dose ébria do teu odor.
Falta, contudo, que me deixes fazê-lo, porque para te dever falta que te marque. E me ames.
Para o Izi.
Tuesday, April 07, 2009
Amaina a tempestade, e o mal acalma: cessando o vento, recolhem-se as vagas. A noite, essa, desce de mansinho, escondida pelas nuvens que se vão desfazendo e ocasionalmente desmentida pelos últimos clarões das descargas. Reina um silêncio de murmúrios, próprios desse longínquo pedaço de oceano sem lar. Povoam a superfície do gigante os seus reflexos: halos perdidos no azul salgado, as estrelas embalam e tudo dorme.
Numa qualquer praia, contudo, alguém solta as amarras a seu barco e o empurra sem esforço pela espuma dos baixios. Chapinham céleres os pés que logo saltam para dentro, o momento suficiente para tornar o passadio cada vez mais pequeno. Vela branca desfraldada, buscando a suave brisa que em breve deixará de o ser, caem nela as primeiras gotas de uma chuva que não será de novo violenta. Inalando o ozono que regressa e o iodo que lhe é familiar, é de costas firmes que tranca o leme mas trémulo quando a ele se encosta: cedendo ao cansaço dos dias e ao torpor que entretanto se instalara, desliza pesado: cai e adormece no convés sem qualquer graça.
Da janela da frente da última casa do promontório, enrosca-se num xaile de gerações a mãe da próxima, acordou angustiada e sabe agora porquê. Funde-se com o horizonte o mastro da embarcação que ajudou a pintar: foi depois de lhe pararem as regras e antes dos grandes enjoos, afirmam as viúvas que será rapaz porque está muito redonda e de pele bonita: talvez saia ao pai se nascer pelo solstício como previsto. Tocando o inchaço e sentindo a criança, endurecem-lhe as feições como aos velhos quando falam dos negócios: esta mulher já não é a mesma, comentarão dentro de alguns anos agradados como o seu filho não sabe o que é desistir. Ajeita resoluta o agasalho e volta para o quarto: está enterrado o marido, o amanhã depende dela.
Monday, April 06, 2009
Sunday, April 05, 2009
Friday, April 03, 2009
Tuesday, March 24, 2009
It's like cleaning a bookcase you haven't visited for a long time: as you take the dusty books out, you keep finding titles you used to read, or just bought because you once liked them, and maybe even some you don't remember why they're there.
You'll probably sit down and go through some, flipping pages, reading some bits for whatever reason, putting others aside for later, or maybe simply discard them all and keep cleaning, because you actually don't care.
It's like cleaning a bookcase you haven't visited in years, to find yourself in a situation you've once read or heard about, but only took like that: another story, because at that time you weren't there.
I wish I had paid attention and labelled them, to now find one empty of don't's, the one with a friendly cover and big, warm letters saying it's actually not wrong to try and pursue what has already been taken by someone else.
Wednesday, March 18, 2009
Friday, March 06, 2009
Não interessa que lá fora buzinem carros, praguejem condutores, gritem peões irritados, toquem às campainhas, passe um eléctrico, se percam as caras na multidão apressada: A música é a mesma de há muitas horas atrás, repetida até à exaustão sem saber não ser ouvida, sobressai o edredão escuro num quarto demasiado arrumado, estão duas plantas tímidas sobre a estante e um livro aberto no tapete, é dia de alimentar os peixes de alguém que foi embora e quis esquecer; parece que esses não lembram ou, se lembram, não sentem; como o gato do outro, autor de lombadas envelhecidas nesse quarto, notar o plural; poder-se-iam mesmo referir coisas banais, como almofadas e candeeiros, incenso e seus queimadores, mini-jardins mais d'oriente e porcelanas de algures no meio, parece ter sido há tanto tempo voltar e ter de arranjar novas molduras, para agora se empilharem em caixas no roupeiro, histórias simples e acarinhadas contadas desorganizadas a meias com algum pó. Apenas uma escapou ao destino, está na terceira gaveta da mesinha da esquerda, mas poder-se-á chamar-lhe moldura se um simples pedaço de vidro e uma base de cartão... e é assim que de repente o mundo pára um pouco mais ainda, porque a fotografia é uma besta e faz sonhar fora d'horas e tu não estás. Por isso está ali, fechada e tão perto, ah, frustração, um dia, um dia vou perder a vergonha e dizer-te que gosto de ti, e deixar o mundo andar… e é assim que ele gira e recomeça, cinzento teimoso acabrunhado, vou tomar banho que já estou atrasada.
Sunday, March 01, 2009
! There are days like this
when everything seems possible,
the smile's easy on your eyes and you
just want to go outside & close
them,
pull a John Livin'. Seagull
& feel the the wind on your face.
[It's a] shame sea's far away, though, and yet
it's actually okay
that the sun makes it up for the clock.
Nevermind, who cares if things make sense,
I'm just gonna be happy
& ask myself nothing else
but "why not", today.
Wednesday, February 11, 2009
Tuesday, January 27, 2009
Saturday, January 10, 2009
Gosto do três e do sete
De sombras ao sol quando chove
Dormir sem sonhar e adiar a madrugada
Sou no preto mar e prata
Lua jazz e uma janela
Noite espaço noite tudo e ninguém
Temo a caneta demais uso a borracha
Contudo chá livros chamas
Ou o bonsai que ainda já não comprei
Ora agora ora por mim
Tagarelam desígnios só vontades
Desconheço por ora no que agora sinais
Espero nos passos ocres e mirra
Pois sou no preto mar e prata
Voltar sem ir lua jazz e uma janela
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