Sunday, August 30, 2009


























Dear Lost,
Would it be too daring to call it an exercise of foretelling? It is no more real than it is a story, but has a great deal to do with how I foresee my own senescence.

Tuesday, August 25, 2009
















“Bolas para esta geringonça!”, exclamou, irritado, o cirurgião velhote que me estava operando o sopro com que nascera. Segurava o meu coração nas mãos, mas era à máquina com foles estranhos que se dirigia. Familiarmente, como se não fosse a primeira vez que se resolvesse a guinchar a meio do procedimento, ameaçando o bom termo da operação.

Engolia ainda o doutor a saliva do impropério e já uma das enfermeiras se deslocara até à máquina insultada, o látex da luva fingindo conforto enquanto duas ou três palavras meigas a incitavam a funcionar. Levantei a cabeça, descrente e curiosa, e paguei ambas com um aperto desconfortável numa das aurículas. “Esteja quieta, menina, que o seu caso é sério.”


«Não faz sentido nenhum, ‘vó», interrompi, seguro do pouco que sabia do desenrolar de uma cirurgia. «Uma intervenção dessas precisa de anestesia, e a senhora não poderia levantar a cabeça.»Achei conveniente simular o ar céptico e condescendente com que meus pais recebiam minhas esfarrapadas desculpas de modo a faltar à escola. Quase correu bem. Tremeluziram as meninas dos olhos com humor à senhora sentada à minha frente, e rapidamente me admoestou. «O menino está interessado em ouvir o resto, creio?»


Queixei-me em surdina às luzes industriais afixadas no tecto de betão pintado. ‘A Geringonça não gosta de mim’. Desejei que sim, pois já me latejavam as frontes devido à falta de oxigénio. Alguém gritou que estava a ficar cianosada, e mais uma vez se contorceu a cara do doutor num esgar de concentração. Voltou a apertar meu coração em diferentes sítios, toques aqui e acolá, aproximou-o do ouvido e repetiu. Repetiu. Repetiu. Até que ecoou pela sala esterilizada um murmúrio de glóbulos apressados e plaquetas histéricas. Uma assistente de caracóis recolheu uma amostra que transportou com todo o cuidado até ao microscópio. “Então?”, quis saber o doutor, cuidando de monitorizar convenientemente os ventrículos, não fosse eu constipar-me e apanhar uma arritmia. O interno riu-se e desligou o aparelho. “É inocente.” Piscou-me o olho à socapa. “A miúda está a crescer.”


«Só isso?!», indignei-me, dividido entre a desilusão do desfecho e a hilaridade das imprecisões médicas. A tendência da minha avó para os dramatismos soft era deliciosa, raramente resistindo à introdução de frases comuns para terminar histórias rocambolescas. «Obviamente que não, pequeno cavaleiro. Tiveram de recolocar o coração e ajeitar as restantes miudezas, encontrar o xifóide e tapar bem com o esterno antes de me darem uns pontos feios de bradar aos céus.» Logo a ela, que bordava tão bem… «Que aconteceu à Geringonça, ‘vó?» «Reformou-se. Pouco depois, veio cá para casa. Queres conhecê-la?» Respondia sempre que sim, como se fosse a primeira vez que ouvia a história.


Continuo sem saber se ela não tinha, de facto, noção de não ser. Mas aquelas tardes passadas a ouvi-la contar aventuras inverosímeis e histórias adulteradas por uma memória traiçoeira, até que minha mãe viesse, zangada, chamar-me para jantar, valeram muito mais do que todos os compêndios decorados a caminho de me tornar médico em sua homenagem. Pediatra, porque aquela miúda-senhora-menina ficou sempre à espera de um dia fazer jus às palavras do interno e crescer.

Monday, August 24, 2009



















Fortalezas à beira-mar, esboroando em lentas derrocadas de areia grossa, a quantas marés havíeis querido assistir?
Aproximam-se as de sizígia: preparai-vos.

Saturday, August 22, 2009



















Dói a ausência da cor na certeza do toque,
O aperto literal esperando que sufoque.
Exuberâncias sumárias fora do leito:
Estilhaços, pedaços de um rumo a teu jeito.